Francisco Rolão Preto (1893-1977)
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- Francisco Rolão Preto (1893-1977)
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- Francisco de Barcelos Rolão Preto nasceu em 1893 e, ainda que o seu nome seja relativamente desconhecido do grande público, foi uma das figuras-chave da ultradireita portuguesa na primeira metade do século XX. Apoiante da causa monárquica e integralista durante a Primeira República, acabou por deixar a sua marca na história de Portugal ao liderar, já no período inicial do Estado Novo, o Movimento Nacional-Sindicalista (MNS), principal variante portuguesa do fascismo, caraterizada pela defesa de valores ultranacionalistas, da mobilização popular e do culto da ação direta. O seu percurso político, contudo, foi muito complexo, com diversas mudanças e reconfigurações ideológicas. Começando por aderir, durante a juventude, à causa monárquica, Rolão Preto participou nas revoltas de Paiva Couceiro após a implantação da República (Pinto 2000: 2-32). Tendo-se exilado na Bélgica, primeiro, e depois em França, o futuro líder do MNS travou contacto direto com algumas das principais figuras da direita reacionária francófona, incluindo Charles Maurras, que nesta fase terá exercido sobre ele forte influência. Também neste período, tornou-se editor da revista Alma Portuguesa, criada em 1913 por monárquicos exilados. Regressando a Portugal em 1917, Rolão Preto envolveu-se ativamente na organização monárquica Integralismo Lusitano (IL), vindo posteriormente a integrar a sua Junta Central.
Contudo, o pensamento de Rolão Preto, exposto nos textos que escreveu para o jornal A Monarquia e no livro de 1920 A Monarquia é a Restauração da Inteligência, destacava-se do de outros integralistas (vincadamente tradicionalistas e elitistas) pela sua propensão para a dinamização da política, algo que já o aproximava daquilo que viria a ser o fascismo; aqui, podem ser detetadas influências de figuras italianas como Enrico Corradini e Gabriele D’Annunzio. De facto, numa série de artigos surgidos em 1922 no jornal A Época (reunidos em 1939 no volume O Fascismo), Rolão Preto faz uma avaliação positiva do movimento de Mussolini, elogiando a sua tendência para a ação direta. Outro elemento presente no seu pensamento era a “questão social” e a necessidade de chamar a classe operária de volta para o nacionalismo, fazendo-a abandonar o comunismo. Para alcançar esse fim, advogava uma “monarquia social” e um “sindicalismo orgânico”, que fosse capaz de ultrapassar tanto o individualismo do capitalismo liberal quanto a luta de classes promovida pelo marxismo e que, através de sindicatos e corporações que unissem os elementos da produção, pusesse termo às tensões sociais, criando uma comunidade nacional harmoniosa.
Ao longo da década de 1920, Rolão Preto esteve associado a diversas organizações de direita radical, tendo inclusivamente colaborado com o General Gomes da Costa no golpe de 28 de Maio de 1926 que pôs fim à República e deu início à Ditadura Militar. Contudo, foi em 1932 que esta figura de proa dos meios nacionalistas foi convidada para se juntar a um grupo de jovens estudantes de Lisboa que, a 15 de Fevereiro desse ano, havia publicado o primeiro número do jornal A Revolução (para a história do Movimento Nacional-Sindicalista, ver Medina 1978). Trazendo consigo outros membros do Integralismo Lusitano, Rolão Preto acabaria por se tornar no líder carismático do MNS, que adaptava ao contexto nacional o aparato e as estratégias de mobilização associadas ao Fascismo italiano (incluindo, entre outros elementos, a saudação romana e o uso de camisa e de símbolos próprios). Assim, ainda que o próprio Rolão Preto tenha por vezes procurado demarcar-se de fenómenos estrangeiros, é relativamente consensual entre os especialistas que este movimento representou a forma mais acabada de fascismo no nosso país, traduzindo-se a sua ideologia num “ultra-nacionalismo palingenético”, no qual o objetivo da mobilização popular e o culto da ação direta e dos valores heroicos eram componentes essenciais.
A ideologia de Rolão Preto nesta época está exposta em vários dos textos que escreveu em 1932, e que incluem Balizas_Directrizes-Alma e Para Além do Comunismo. Neles, encontramos um projeto político em que ainda está presente o corporativismo da fase integralista, mas aos quais se junta agora um culto explícito da juventude e uma intenção declarada de dinamizar a sociedade através de métodos revolucionários. Ademais, a reverência pela figura do rei, que deveria liderar o sistema corporativo, parece ter sido substituída pelo culto de um chefe carismático, mais próximo do modelo de Mussolini ou de Hitler (Martins 2020: 110). Assim, é possível dizer que o MNS representou uma “fascização” do conteúdo ideológico do IL e que o percurso de Rolão Preto, transitando da direita radical reacionária para o fascismo, encontra paralelos noutras figuras europeias, sendo o caso mais evidente o do francês Georges Valois. Entretanto, o crescimento do MNS causava apreensão à elite conservadora do regime, que então contava com António de Oliveira Salazar como seu novo líder. Espelhando as interações entre o conservadorismo autoritário e o fascismo – que também ocorreram noutros países, e que podiam incluir alianças e influências mútuas mas também, frequentemente, acirrados conflitos –, a contenda entre o ditador português e o líder do Nacional-Sindicalismo acentuou-se em 1933. Salazar limitou a ação política do MNS, fechando as suas sedes e proibindo as suas publicações, ao mesmo tempo que procurava – com sucesso – atrair para o seu lado algumas das alas mais “moderadas” do grupo de Rolão Preto, numa nota oficiosa de 29 de julho de 1934, o movimento acabaria por ser proibido, o que colocou um fim à história do fascismo enquanto movimento no Portugal de entreguerras.
Tendo vivido por algum tempo exilado em Espanha, onde estabeleceu laços com a Falange de Primo de Rivera, o antigo líder do MNS não deixaria de conspirar contra Salazar e de, inclusivamente, se envolver numa tentativa fracassada de golpe, a ter lugar em setembro de 1935. Na segunda metade da década de 1930, a sua ideologia era ainda a do fascismo, tendo apoiado os falangistas na guerra civil espanhola. Contudo, ao chegar a 1945, era evidente a sua desilusão com os regimes de Hitler e Mussolini, acusando-os, no livro A Traição Burguesa, de terem defraudado os ideais revolucionários. Mais tarde, Rolão Preto terá renegado definitivamente o fascismo, bem como pensadores – como Georges Sorel e Maurras – que o haviam influenciado no início da sua carreira política. Sem nunca ter abandonado o anti-salazarismo, Rolão Preto aproximou-se então da oposição democrática ao Estado Novo, ao apoiar as candidaturas de Norton de Matos (em 1949) e Humberto Delgado (em 1958). Segundo José Melo Alexandrino (2023: xvii), a biografia política do líder do MNS é constituída por dois grandes ciclos: um primeiro que vai de 1915 a 1935 e, depois de uma fase de transição, um segundo período que começa em 1945. Este último representou uma reconfiguração ideológica radical, que o teria levado a abraçar os princípios da democracia representativa e da liberdade individual. Francisco Rolão Preto viveria o suficiente para testemunhar a morte do seu maior rival, Salazar, bem como a queda do Estado Novo, com a Revolução de 1974, que acolheu positivamente. Depois de aderir ao Partido Popular Monárquico, faleceu a 18 de dezembro de 1977, deixando atrás de si um percurso rico em contradições, e que importa conhecer para compreender o século XX português.
- Creator
- Martins, Carlos Pereira
- Relation
- ICS-ULisboa
- Abstract
- Inicialmente influenciado por algumas das principais figuras da direita reacionária francófona, Rolão Preto viria a aproximar-se do fascismo, sob influência de figuras italianas como Corradini e D’Annunzio. Líder do Movimento Nacional-Sindicalista, seguidor de Mussolini, entraria em conflito com Salazar no período inicial da ditadura do Estado Novo e passaria mesmo algum tempo exilado em Espanha. Já na segunda metade do século, terá renegado o fascismo, e em particular pensadores como Sorel e Maurras, que o haviam influenciado no início da sua carreira política.
- Date Issued
- 31-10-2024
- References
- Alexandrino, José Melo (org.) 2023. Obras Completas de Rolão Preto. Lisboa: Colibri.
Martins, Carlos (2020). From Hitler to Codreanu: The Ideology of Fascist Leaders. Londres: Routledge.
Medina, João (1978). Salazar e os Fascistas. Lisboa: Bertrand.
Pinto, António Costa (2000). The Blue Shirts: Portuguese Fascists and the New State. Nova Iorque: Columbia University Press.
Dublin Core
Collection
Citation
Martins, Carlos Pereira, “Francisco Rolão Preto (1893-1977),” Connecting Portuguese History, accessed November 21, 2024, https://connectingportuguesehistory.org/omeka/items/show/18.